Tribunais dos Povos dos Oceanos, das Águas e da Pesca Cortando as redes do capital e tecendo redes de solidariedade

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Este relatório analisa provas de sete Tribunais dos Oceanos, da Água e dos Pescadores em seis países, destacando os principais testemunhos, exigências e recomendações. Pretende alargar as lutas dos povos pescadores pela justiça, enfatizando a sua ligação à natureza e a necessidade de solidariedade internacional.

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Prefácio

Existem duas maneiras diferentes de imaginar nossos oceanos, rios e lagos. Há quem trate os corpos d’água como oportunidades econômicas, como uma “economia azul”, algo que pode ser explorado mas de alguma forma equilibrado com políticas de sustentabilidade. Eles prevêem governar corpos d’água por meio de mercados e instrumentos financeiros. Pensar nestes termos orientados para o mercado garantirá um mundo repleto de desigualdade e violência.

No entanto, existem aqueles cujas vidas estão interligadas com corpos d’água. Os povos dos oceanos, das água e da pesca são essenciais para os ecossistemas aquáticos e para a vida. Eles entendem os oceanos, rios e lagos como fundamentais para quem eles são e seu modo de vida. A plena realização dos direitos humanos dos povos dos oceanos, das águas e da pesca é a forma mais poderosa de garantir que os corpos d’água do mundo prosperem.

O processo e a sentença dos Tribunais dos Povos do Oceano, da Água e dos Pescadores constituem uma das expressões mais importantes da solidariedade internacional em relação à vida aquática. Eles fornecem uma compreensão crucial do que está em jogo e do que deve ser feito para garantir que as nossos corpos d’água continuem a ser a fonte da vida.

Michael Fakhri - Relator Especial da ONU sobre o Direito à Alimentação

Principais Resultados

  • Os Tribunais dos Povos dos Oceanos, das Águas e da Pesca, organizados pelo movimento global dos/as pescadores/ as, são poderosos fóruns de justiça centrados em ouvir os testemunhos e as experiências de abusos dos direitos humanos, enfrentados pelas comunidades pesqueiras e em exigir ações políticas e solidariedade para garantir a proteção dos direitos humanos dos povos pescadores.
  • Os ambientes aquáticos, em especial, os oceanos, constituem uma nova fronteira para a aquisição e acúmulo de capital. Isso está causando a desapropriação dos povos dos oceanos, das águas e da pesca de seus territórios e meios de subsistência.
  • Os Tribunais dos Povos dos Oceanos, das Águas e da Pesca demonstram que a “economia azul” representa uma reformulação da economia dos oceanos – supostamente em termos de desenvolvimento sustentável. Embora as oportunidades econômicas sejam promovidas como sustentáveis, o crescimento é priorizado às custas de danos sociais e ambientais.
  • Em todos os países onde os Tribunais ocorreram, os órgãos governamentais trabalham em estreita colaboração com as empresas. Esses funcionam como ‘intermediários’ para grandes investidores, priorizando os investimentos ao invés de proteger os direitos humanos dos povos da pesca, a governança democrática de seus territórios e a integridade de seus ecossistemas.
  • Os processos de aquisição nos oceanos, nas águas e na terra estão interconectados. Para compreendermos os impactos da economia dos oceanos nos povos da pesca, faz-se necessário uma análise intersetorial de diversos setores econômicos que dependem uns dos outros.
  • A expansão da economia dos oceanos contribui para a centralização do poder e a erosão dos processos democráticos, servindo aos interesses das elites, corporações multinacionais, empresas estatais estrangeiras, bancos e financiamento privado. Isso é feito através da aprovação de reformas que diluem as leis sociais, laborais e ambientais e também de políticas que aceleram a aprovação de projetos com pouca ou nenhuma participação de outros níveis de governo e da sociedade civil.
  • Os/As pescadores/pescadoras em todos os países dos Tribunais dos Povos estão cada vez mais sujeitos à desapro- priação e à privação progressiva dos direitos consuetudinários de acesso e uso de seus territórios. Em muitos casos, isso é conseguido por meio do Planejamento Espacial Marinho, anunciado como democrático, mas que encobre grandes desequilíbrios de poder.
  • Os povos pescadores estão enfrentando a crescente criminalização pelo Estado. A violência das forças de segurança militares e privadas é usada para limitar o acesso e o controle sobre seus territórios e áreas de pesca, resultando em maiores riscos de acusações do ponto de vista penal, ferimentos ou morte.
  • As populações de pescadores/pescadoras estão passando por transições precárias para trabalhos de baixa remu- neração, o que acaba impulsionando a migração e o endividamento das famílias. Isso afeta desproporcionalmente as mulheres racializadas ou de grupos sociais mais oprimidos como castas baixas no Sri Lanka e India, cujo trabalho na captura, limpeza, processamento e comércio de peixes é frequentemente negligenciado e excluído dos serviços de seguridade social e apoio do Estado.
  • É fundamental que o movimento de pescadores/pescadoras continue a fortalecer suas redes de solidariedade e a unir politicamente as lutas dos povos e trabalhadores dos oceanos, das águas e da pesca com as dos agricultores, trabalhadores portuários, tripulações de navios, trabalhadores de fábricas, povos indígenas e outros grupos racializados, mulheres, pessoas LGBTIQ+, jovens, idosos e migrantes. Todos esses grupos vivenciam condições de vida cada vez mais precárias, ao mesmo tempo em que enfrentam eventos climáticos mais frequentes e extremos.